Sobre as músicas do blog... Não devem ser consideradas simples "fundos musicais" para os textos... Foram escolhidas com carinho e apreço, dentre o que há de melhor... São verdadeiras jóias que superam em muito os textos deste humilde escrevinhador... Assim, ao terminar de ler certo texto, se houver música na postagem, termine de ouví-la, retorne, ouça-a novamente se toda atenção foi antes dedicada ao texto... "interromper uma bela música é como interromper uma boa foda... Isso não se faz!..." Por último, se você conhece uma música que, na sua opinião, combina melhor com o texto, não deixe de enviar sua sugestão...

O amor nunca morre de morte natural...

Contrariando o costume do blog, este post na página principal não pertence ao autor do blog e a música, também, não é instrumental... As razões
vão ao final do post.
Musica: "If", de David Gates. Interpretação de Frank Sinatra.


'sad and tired man' (2010) - Silvia Jelitto - Óleo sobre tela

O amor nunca morre de morte natural...


Morre porque o matamos ou o deixamos morrer.
Morre envenenado pela angústia. Morre enforcado pelo abraço. Morre esfaqueado pelas costas. Morre eletrocutado pela sinceridade.
Morre atropelado pela grosseria. Morre sufocado pela desavença.
Mortes patéticas, cruéis, sem obituário e missa de sétimo dia. Mortes sem sangramento. Lavadas. Com os ossos e as lembranças deslocados.
O amor não morre de velhice, em paz com a cama e com a fortuna dos dedos. Morre com um beijo dado sem ênfase. Um dia morno. Uma indiferença. Uma conversa surda.
Morre porque queremos que morra. Decidimos que ele está morto. Facilitamos seu estremecimento. 
O amor não poderia morrer, ele não tem fim. Nós que criamos a despedida por não suportar sua longevidade. Por invejar que ele seja maior do que a nossa vida.
O fim do amor não será suicídio. O amor é sempre homicídio. A boca estará estranhamente carregada. 
Repassei os olhos pelos meus namoros e casamentos. Permiti que o amor morresse.
Eu o vi indo para o mar de noite e não socorri. Eu vi que ele poderia escorregar dos andares da memória e não apressei o corrimão. Não avisei o amor no primeiro sinal de fraqueza. No primeiro acidente. Aceitei que desmoronasse, não levantei as ruínas sobre o passado. Fui orgulhoso e não me arrependi. Meu orgulho não salvou ninguém.
O orgulho não salva, o orgulho coleciona mortos...No mínimo, merecia ser incriminado por omissão... Mas talvez eu tenha matado meus amores. Seja um serial killer... Perigoso, silencioso, como todos os amantes, com aparência inofensiva de balconista. Fiz da dor uma alegria quando não restava alegria... Mato, não confesso e repito os rituais... Escondo o corpo dela em meu próprio corpo. Durmo suando frio e disfarço que foi um pesadelo. Desfaço as pistas e suspeitas assim que termino o relacionamento. Queimo o que fui. E recomeço, com a certeza de que não houve testemunhas.
Mato porque não tolero o contraponto. A divergência. Mato porque ela conheceu meu lado escuro e estou envergonhado. Mato e mudo de personalidade, ao invés de conviver com minhas personalidades inacabadas e falhas.
Mato porque aguardava o elogio e recebia de volta a verdade.
O amor é perigoso para quem não resolveu seus problemas. O amor delata, o amor incomoda, o amor ofende, fala as coisas mais extraordinárias sem recuar. O amor é a boca suja. O amor repetirá na cozinha o que foi contado em segredo no quarto. O amor vai abrir o assoalho, o porão proibido, fazer faxina em sua casa. Colocar fora o que precisava, reintegrar ao armário o que temia rever.  
O amor é sempre assassinado. Para confiarmos a nossa vida para outra pessoa, devemos saber o que fizemos antes com ela.
— Fabrício Carpinejar

A man can reach a such level of sadness
that cannot write, think... even cry.

Um comentário:

  1. Eu acredito que o amor nunca morre, posto que é imortal. Penso que o amor cansa e vai embora, nos deixa à mercê de nossa falta de cuidados.O que ficam são as dores,as lembranças e arrependmentos como fantasmas a nos assombrar, esfregando em nossa cara a nossa própria incompetência.
    Mas, como dizia Drummond:
    "Amor é primo da morte,E da morte vencedor,
    Por mais que o matem (e matam)
    A cada instante de amor.
    Excelente escolha... sou fã de Carpinejar

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